Mesmo com a vida voltando ao “novo normal”, a pandemia mudou consideravelmente o modelo de trabalho. Entre as incontáveis possibilidades trazidas pelo Home Office, poder trabalhar de qualquer lugar do mundo talvez seja a mais amada pelos aderidos.
Se, em fevereiro de 2020, alguém falasse que passaríamos os próximos dois anos trabalhando na sala de casa, ninguém acreditaria. Mas, em março de 2020, isso se tornou realidade. A caminhada até a estação de metrô mais próxima foi trocada pelo caminho entre o quarto e a sala – que em muitas casas se tornou escritório, coworking da família ou sala de aula das crianças. O almoço com os colegas deu espaço para um almoço seguido de um cochilo na própria cama e as reuniões se tornaram longas ligações pelo computador. Se é bom ou ruim, melhor ou pior, ninguém sabe ao certo. O que se sabe, dois anos depois, é que o “novo normal” é muito diferente do que estávamos acostumados.
Para a edição #Metrópole, o Moveh quis entender o que levamos e o que queremos esquecer desses dois longos anos trabalhando em casa. A mudança na vida de quem economiza 15 horas semanais no transporte público e a opinião de quem entende do assunto nos ajudam a entender o que ganha e o que perde quem tem a liberdade de trabalhar de qualquer lugar do mundo.
O que dizem os especialistas
“Quando falamos em qualidade de vida, estamos nos referindo à satisfação do funcionário com o trabalho, motivação e valorização, saúde física e mental e tempo para dedicação às questões familiares e pessoais. Estes são os maiores desafios da gestão do trabalho no modelo home office”, afirma a consultora de Recursos Humanos e especialista em Gestão de Pessoas, Dilza Taranto. Em relação à empresa, segundo a gestora, as obrigações são muito bem estabelecidas: “a empresa precisa garantir, pelo menos, que o funcionário tenha infraestrutura adequada em casa, disponibilizar treinamentos online, estabelecer metas a serem cumpridas e ter excelência na gestão do trabalho”.
No lado do funcionário, as obrigações são diferentes. Segundo Taranto, ao optar por uma rotina de trabalho remoto, deve-se levar em consideração a falta de socialização, as distrações com as tarefas domésticas e as condições do ambiente de trabalho. Em contrapartida, os benefícios variam entre uma maior produtividade, a eliminação do tempo de transporte e uma maior liberdade no horário de trabalho. Somando tudo, de acordo com a especialista, o que vale é manter uma rotina saudável e equilibrada: “com o home office, o funcionário trabalha mais por entrega do que por horas trabalhadas, logo, precisará ter mais comprometimento com seus resultados e disciplina na utilização do tempo. A diferença entre agregar e prejudicar está no equilíbrio”. No fim do do expediente, na visão da especialista, o importante é dosar as horas de trabalho, dividir bem os espaços e tentar driblar a falta de interação com os colegas.
O que pensa quem vive isso na prática
Na entrevista de emprego, Ana Vitória Sessa precisou avisar a empresa que estava com uma passagem comprada para Madrid. A intenção era estudar 5 meses na Europa e aproveitar a flexibilidade do home office no antigo trabalho. A empresa nova – no caso, a Cielo – aceitou. A publicitária foi contratada como Community Manager, calculou o fuso da Espanha e trabalhou, durante o intercâmbio, das 12h às 21h. De volta ao Brasil, Sessa passou a trabalhar das 8h30 às 17h30 sem flexibilidade de horário. Mas, o que não pode mudar no turno, a publicitária pode escolher no modelo: presencial, home office, híbrido, na casa dos pais ou até em um café quando quer mudar de ambiente. Com a obrigação de ir ao escritório apenas uma vez por mês, Sessa não abre mão da liberdade que tem em relação à escolha. Segundo ela, o mais saudável é poder escolher o que quer: “Se um dia eu acordar e quiser ir para o escritório, eu posso. Se não, fico em casa. Deixarem essa decisão para mim é saudável. Eles falam: é seu corpo, sua rotina, você escolhe o que é melhor. Mas acordar, tomar meu café tranquilo, trabalhar com roupa confortável e ter um tempo livre no almoço faz diferença para mim. Para mim, o saudável não é nem um e nem outro: é poder escolher fazer o que eu quiser”
Seja pelo café da manhã demorado, pela roupa social que continua no armário ou pelas três horas diárias no transporte público que são poupadas, a publicitária reconhece que trabalhar de casa tem seus problemas, mas que eles não são quase nada comparados aos benefícios do home office. “Eu sinto que a troca, principalmente no marketing, ainda é muito maior no presencial”, afirma. “Eu sinto falta disso, de ter uma dúvida e perguntar para a pessoa que está na cadeira do lado. Mas não sinto falta a ponto de querer ir todos os dias, jamais”. Nas eventuais idas ao escritório, Sessa demora cerca de 1h30 em cada trajeto. As mais de 15 horas que são poupadas semanalmente deram espaço para uma caminhada na praia quando ela está na casa dos pais, um jantar com as amigas em pleno dia de semana ou em eventuais viagens. “O caos de São Paulo me cansa. Então, poder acordar, fazer o que eu quiser naquele momento, tomar um café tranquila e descansar na hora do almoço muda meu dia. No fim do expediente também. Se eu saio às 17h30, eu tenho uma noite inteira, posso fazer alguma coisa, sair para jantar com alguma amiga. Se estou no escritório, chego em casa quase 20h da noite. Quero chegar, tomar um banho, ver um filme e dormir”.
Há pouco mais de seis meses na empresa, Sessa já vê os impactos do Home Office na sua rotina. Segundo ela, a livre escolha do modelo de trabalho transformou a sua relação com o próprio emprego. “Eu me sinto completamente livre e acho que isso é o mais importante para mim. Eu posso escolher se posso trabalhar no escritório, em casa, na casa dos meus pais ou do outro lado do mundo. Parece que o trabalho não é mais algo que me impede de fazer as coisas”, afirma a publicitária. “Se quero viajar durante a semana, se tem internet e cabe no meu planejamento financeiro, eu vou. O trabalho não me impede mais de fazer as coisas. Madrid foi a prova disso, eu trabalhei em vários lugares diferentes”, completa.