Seja para fugir do trânsito ou para chegar com o corpo já acordado, essas pessoas optam, todos os dias, pela bicicleta.
De casa para o trabalho, do trabalho para a psicóloga e da psicóloga para o rolê. Esse é o caminho que a radialista Tamiris Oliveira, 24, costuma fazer acompanhada de sua bicicleta. Da mesma forma, o analista de consultoria Gustavo Rubin, 24, usa a bicicleta como meio de transporte para tudo. Segundo ele, a vantagem é conseguir calcular o próprio tempo e não depender do trânsito. José Antônio, 55, em contrapartida, não começou a usar por opção. O despachante aduaneiro precisou usar a bicicleta por ordem médica depois de ser diagnosticado com um princípio de AVC. Já a jornalista Vivian Ortiz, 38, é uma fã nata. Elétrica ou manual, na Praia Grande ou em São Paulo, na lua de mel ou no caminho para o trabalho, a bicicleta sempre a acompanhou.
Para a #EdiçãoMetrópoles, o Moveh conversou com quatro pessoas que decidiram manter o corpo em movimento no meio do caos que é uma cidade grande.
TAMIRIS, 24
Quando percebeu que poderia levar a metade do tempo que costumava levar entre o trabalho e a terapia, a radialista Tamiris Oliveira, 24, se apaixonou pela bicicleta. O amor à primeira vista durou e, em pouco mais de um mês, a bicicleta já a acompanhava em outros caminhos. De casa para o trabalho, do trabalho para a terapia e até para o rolê de sexta-feira. Entre as muitas características da bicicleta que atraem Tamiris, talvez a maior seja a liberdade de controlar o próprio tempo. “O diferencial da bicicleta é que todo dia você vai levar o mesmo tempo, independente do que haja no meio do caminho. Em um trajeto de 6km, por exemplo, você sabe que sempre vai gastar entre 25 e 30 minutos. É incrível. Foi isso que me motivou”, conta.
Assim que percebeu que não dependeria mais do trânsito ou dos horários do ônibus, a decisão de ir para o trabalho usando a bicicleta foi fácil. “Era um trajeto muito rápido de ônibus, mas tinha um farol em específico que se os carros fechassem o cruzamento, eu passava 15 minutos dentro do ônibus. Aquilo me desmotivava. Eu saía a tempo, mas chegava atrasada”, relata a radialista. Muito mais do que o tempo do trajeto, a bicicleta também influenciou o rendimento de Tamiris no trabalho. “O fato de eu chegar menos estressada e bem humorada me fazem chegar mais disposta para trabalhar”, revela. “Eu chego muito mais animada e motivada. Todo aquele stress que eu tinha quando pegava o ônibus cheio ou ficava parada no trânsito parou de existir”, completa.
Na hora de ir embora, a questão do tempo fica ainda mais presente na vida da radialista: “Enquanto as pessoas ficam pensando no trânsito ou no rodízio, eu não tenho que me preocupar. Em um dia de greve dos transportes públicos em que a cidade ficou travada e o rodízio ficou suspenso, as avenidas não andavam porque todo mundo estava tentando chegar em casa de alguma forma. Eu estava de bicicleta, vendo aquilo e estava tranquila”, brinca. Em dias de chuva, Tamiris continua preferindo ir de bicicleta. Com a possibilidade de tomar banho no trabalho caso se molhe, a opção foi investir em equipamentos à prova d’água. “Eu investi em uma mochila resistente, então as minhas coisas não molham e eu continuo preferindo ir pedalando. Eu pego menos trânsito e tenho mais qualidade de vida. No final, acho até divertido”, conta.
No fim da pedalada, o saldo é sempre positivo. “A bicicleta impactou minha vida de inúmeras formas”, revela. “Eu não comecei a usá-la só para trabalhar, eu passei a andar de bicicleta. Agora, eu vou no médico de bicicleta, vou fazer compras ou só passear. Mexeu muito com a minha autoestima, mas não é sobre perder peso, o que acabou acontecendo. Eu me sinto muito mais poderosa e confiante em uma bicicleta. Conheci pessoas, me envolvi em grupos de pedal, grupos de mulheres que andam de bicicleta e têm rodas de discussão sobre o tema”.
GUSTAVO, 24
A bicicleta sempre teve um lugar especial no coração do analista de consultoria Gustavo Rubin, 24. Mesmo assim, ela estava presente apenas durante as férias e nos raros “rolês” pelos parques de São Paulo. Em 2019, porém, o cenário mudou. Ainda no antigo trabalho, Rubin começou a usar a bicicleta como um de seus meios de transporte e as eventuais idas ao escritório de bicicleta foram se tornando cada vez mais comuns. Quando mudou para o atual emprego, mais próximo de sua casa, decidiu que elas seriam rotina. O trajeto até o novo escritório é mais rápido se feito de bike e a escolha foi juntar o útil ao agradável: “chego mais rápido, dou uma acordada, faço um aeróbico e ainda tomo um vento na cara”, brinca o analista.
Assim como Tamiris, uma das coisas que mais atraem Gustavo é o fato de que a bicicleta permite que ele calcule o próprio tempo. Morador de Pinheiros, bairro nobre de São Paulo com boa infraestrutura quando o assunto é bicicleta, o analista foge do trânsito e ainda tem segurança na ciclofaixa. Isso sem contar, é claro, com a disposição e a sensação de liberdade trazidas pela bicicleta, que impactam a vida de Rubin dentro e fora do trabalho. “O primeiro benefício que eu senti foi me sentir melhor e mais disposto para o trabalho. Fora isso, [foi] sentir essa autonomia que a bicicleta me dá de poder ir para onde eu quiser”, explica o analista.
Fora do expediente, a bicicleta é muito mais do que o meio de transporte mais usado por Rubin. “A bicicleta faz parte da minha vida”, afirma. Desde que começou a usá-la como meio de transporte para o trabalho, em 2019, a bicicleta foi conquistando cada vez mais espaço na vida do analista. “Eu não uso só como meio de transporte para ir para o trabalho. Eu uso para ir para a casa de um amigo, para qualquer compromisso que eu tenho. Ela começou a fazer parte da minha vida de verdade, não só como um “rolê”, algo que eu fazia de vez em quando como lazer”.
JOSÉ ANTÔNIO, 55
Nem por escolha, nem por paixão: pela saúde. Esse foi o grande motivo que levou o despachante aduaneiro José Antônio Moura, 55, a começar a ir de bicicleta para o trabalho. Morador de Santos, Moura precisou mudar drasticamente sua rotina após ser alertado pelo médico que poderia estar tendo um princípio de AVC. “O médico me perguntou como era minha rotina. Eu contei que ficava 9h na frente do computador, chegava em casa, fazia meu lanche e assistia TV até a hora de dormir. Ele me mandou voltar para a academia”, explica. “Eu disse que não voltaria. Fazia mais de 25 anos que eu não pisava numa academia. Quando eu era garoto era legal, mas não ia voltar agora”, brinca.
A solução do médico foi achar outro esporte que o despachante gostasse, já que a prática precisaria ser diária. Em conjunto, a escolha foi a bicicleta. “Ele propôs que eu fosse de bicicleta para o trabalho, mas com uma condição: não ir pelas avenidas, porque tem muito carro e eu não iria relaxar. Ele falou: “ache um caminho que você veja árvores, plantas e pássaros”. Comecei a ir pela Washington Luiz, no canal três [de Santos] e comecei a encontrar vários ninhos de maritaca. Me encantei”, relata.
Três anos depois da mudança, Moura afirma que, dentro e fora do trabalho, sua vida é outra: “Estou mais rápido, mais positivo. O pessoal brinca que eu estou vendo passarinho azul”. Em relação à família, o despachante relata que seu humor melhorou, que está mais paciente e que tem mais tempo de qualidade ao lado da esposa e dos filhos. No trabalho, a situação também é positiva: “o meu raciocínio está mais rápido, estou tirando de letra”, brinca. “Às vezes, alguma coisa que para alguém parece não ter resolução, na minha frente parece óbvio. Eu acho que, às vezes, a pessoa pensa em tanta coisa que tem para fazer que esquece de relaxar. Eu, não: já chego relaxado no trabalho porque vim pedalando, vi pessoas, vi pássaros”, completa.
Além da relação com a família e com o trabalho, Moura comenta que outra relação foi estabelecida desde que começou a ir de bicicleta para o trabalho. “A minha relação com a bicicleta ficou legal. ela é minha melhor amiga”, afirma. “É um meio de transporte que virou febre, então eu encontro muitos colegas no meio do caminho. A gente pedala juntos até certo lugar e depois vai cada um para seu canto. Estou pensando em comprar outra, agora com marcha”. Fora isso, sua relação consigo mesmo também mudou. “Desde que comecei, perdi peso, não tenho mais ‘aquela barrigona’, minhas roupas voltaram a me servir. Renovei o guarda roupa sem querer, sem gastar dinheiro. Olha que coisa legal”, brinca o despachante.
VIVIAN, 38
O amor da jornalista Vivian Ortiz pela bicicleta é antigo. A relação entre as duas começou na adolescência, quando ela ainda morava na Praia Grande. Depois da faculdade, quando se mudou para São Paulo, a paixão perdeu um pouco de espaço. No início da vida na capital, Ortiz usava o transporte público para ir ao trabalho. Ás vezes, quando tinha vontade, voltava a pé. “Eu sempre gostei de curtir a cidade. Eu acho que é uma forma de se movimentar, conhecer a cidade”, conta a jornalista. Quando começou a trabalhar na redação do UOL, que à época ficava entre a Avenida Brigadeiro Faria Lima e a Avenida Rebouças, voltou a olhar com outros olhos para a bicicleta. O caminho era mais tranquilo e um ponto de bicicletas do Itaú foi instalado na frente do escritório. Juntando o útil ao agradável, Ortiz se reconectou com a paixão antiga.
Desde então, a bicicleta não saiu mais da vida da jornalista. Na sua viagem de lua de mel, decidiu alugar uma bicicleta elétrica com o marido e conhecer a cidade com outros olhos. Voltou para casa apaixonada pela tecnologia e decidiu ter uma para chamar de sua. Em 2018, entrou em um novo emprego, que fica a, aproximadamente, 11km de sua casa. Mesmo com a distância considerável, optou por fazer o caminho de bicicleta. “Eu não tinha o costume de usar o carro. Se não fosse de bicicleta, ia de transporte público. E, se você olhar, na verdade eu levo o mesmo tempo”, conta a jornalista. “Mas a bicicleta é uma filosofia de vida. É ar, você respira, olha o caminho”, completa. Em relação ao rendimento no trabalho, a jornalista também não esconde que muita coisa mudou: “Eu chego mais desperta e mais animada porque já tive uma dose de endorfina no corpo. E, na hora de ir embora, o contrário: é um momento em que eu relaxo. Na ida tem horário, mas na volta não. Eu sempre fazia um caminho novo, descobria uma rota diferente. Ia experimentando os caminhos, relaxando. Quando comecei a fazer live no trabalho, ia até treinando minhas falas”
Muito mais do que apenas o transporte para o trabalho, a bicicleta ocupa um grande espaço na vida de Ortiz. Depois de um tempo insistindo, ela convenceu o marido a embarcar nas suas aventuras e os dois percorrem São Paulo de bicicleta. “Andar de bike é meu estilo de vida, um respiro no meio dessa vida louca que a gente vive”, relata a jornalista. “Não é só um exercício em si. Eu acho que ele agrega na minha vida como exercício, mas eu não faço porque preciso malhar. Eu faço porque quero dar uma volta, conhecer a cidade”, completa.