Conheça o “PretosRun”, o coletivo de corrida que te convida a olhar com novos olhos para o Vale do Anhangabaú, no centro de São Paulo.
Não é preciso conhecer tanto de São Paulo para saber que o centro da cidade não é um lugar convencional para praticar esportes. Seja pela segurança ou pela falta de infraestrutura, a região central paulistana é pouco habitada por atletas. Mas, se você chegar às 9h da manhã de um domingo na frente do Vale do Anhangabaú, vai encontrar um grupo de pessoas se reunindo para correr. O grupo é o “Pretos Run”, um coletivo de corrida criado pelo educador físico Beto Tavares. Patrocinado pelo “Adidas Runner”, o grupo reúne pessoas que querem praticar esportes, pensar sobre inclusão e conhecer o centro de São Paulo a pé.
“As pessoas sempre falam para tomar cuidado, que é perigoso e tudo mais. Mas, domingo, às 9h da manhã, você não encontra ninguém no centro. E, assim, a gente consegue ver a cidade de outra forma”, explica o criador. “Eu sempre tive uma coisa na cabeça: não queria ensinar as pessoas a correr em parques. Eu ia ao Parque Ibirapuera e pensava: “a cidade é tão grande, por que todo mundo vai ao parque?”. Não que eles não devam ir, mas têm que saber que também existem outros lugares”.
Mais do que conhecer o centro, o objetivo do Pretos Run também é incentivar a prática esportiva e a inclusão: “O grupo de corrida que eu montei é sobre você ir. Não importa seu gênero, sua cor, nada. Se você quiser participar, você pode. E as pessoas chegam lá e começam quietas e tímidas, mas se soltam com o tempo”. Criado durante a pandemia e mobilizando apenas 10 pessoas no primeiro evento, o grupo já conta com mais de 60 participantes por treino e mais de mil seguidores no instagram.
“Quando eu criei o PretosRun, tinha o propósito da causa racial. Mas, eu não achei que ia ser tão forte. As 10 pessoas do primeiro treino foram se transformando, puxando outras pessoas”, comenta XXX. “Eu nunca imaginei que 60 pessoas iam acompanhar uma ideia que, além da corrida, traz essa carga. No fim, eu não queria criar um grupo de corrida que falasse sobre questões raciais. Eu queria não precisar disso. Mas, hoje, ainda é necessário”.
(Des)Centralização do esporte
A justificativa para a escolha do Centro da Cidade é, segundo Tavares, mais uma questão sobre inclusão no esporte. “Correr no Vale do Anhangabaú implica em ver novas realidades, enxergar um lugar que está passando por um período muito complicado. Meu objetivo também é mostrar que você pode correr em outros lugares que não o parque, que a gente tem que descentralizar esses lugares de corrida. Uma pessoa que mora na Zona Leste, por exemplo, não vai ao Ibirapuera”, explica o fundador. “Então, se fosse no parque, ela não iria. Mas, no centro da cidade, ela vai. Todos os bairros levam ao centro da cidade. Tem metrô, ônibus, tudo. Fora isso, o que eu quis trazer foi: vamos incluir num lugar que não é incluso”.
“Uma participante me disse que correr ali a transformou numa pessoa mais humana, no sentido de se sentir privilegiada e de, através da corrida, se tornar uma pessoa melhor”, relata Tavares. “E é isso que penso, que através do esporte vem a transformação, mas não é no esporte que ela vai ser entregue. Através do esporte você muda seu jeito de pensar, as causas que você defende, o jeito que você olha para outro. Porque quando você para, percebe que correu, viu outras realidades, conheceu novos lugares. E esse pensamento vai além da corrida. Por isso que eu sempre digo que a gente tem que sair do cercadinho. Quando a gente corre no parque, a gente está dentro de um cercadinho. Vamos encarar a verdade”.