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Precisamos conversar sobre viver e morrer

O inFinito promove “conversas sinceras sobre viver e morrer”. Tom Almeida, idealizador, conversou com o Moveh sobre o projeto que vê a morte como (mais) um movimento da vida

“A morte não é o oposto da vida. Ela faz parte dela”, afirma Tom Almeida, 51, criador do movimento inFinito (@infinito.etc). Publicitário de formação, Almeida encara a morte de um jeito não convencional e busca conversar sobre novas formas de encarar as perdas. Através de “conversas sinceras sobre viver e morrer”, o publicitário propõe debates, sessões de cinema e até “jantares da morte”. Longe de ter apenas encontros mórbidos, o propósito de Almeida com o inFinito é conversar sobre “perda, luto, dores e amores”. Isso tudo porque, para ele, conversar sobre a morte é conversar sobre a vida. E mais: nada adianta negá-la e não conversar sobre. 

‘ “Sempre falam que ‘a única certeza que temos é que vamos morrer’. E, quando as pessoas me falam isso, eu respondo: ‘Você tem certeza mesmo?’”, brinca Almeida. “Porque, às vezes, as pessoas usam isso como uma desculpa para não falar sobre a morte, como quem diz ‘vamos falar de outra coisa?’. É como se as pessoas falassem ‘ah, mas isso já tá resolvido’. E não, não está. Justamente por isso precisamos conversar sobre”, completa. Para o idealizador do movimento, olhar para a morte e conversar sobre ela traz mais sentido para a vida. E, ainda segundo ele, uma vez que inata a nós, negar a morte só nos traz mais sofrimento. 

“A gente vive perdendo alguma coisa”, afirma Almeida. “Alguma coisa, a todo momento, morre na nossa vida. Se a gente olhar para os ciclos da natureza, a todo momento tem algo morrendo, mas também algo nascendo. Quantas partes de nós morrem? E ainda bem que a gente deixa de ser o que a gente era e vai evoluindo.  É um processo de crescimento, autoconhecimento e amadurecimento”, afirma o publicitário. “E isso não é uma questão minha, não é o Tom que veio com uma ideia super ideia transgressora. Na verdade, isso faz parte da filosofia, das tradições religiosas e das culturas milenares de olhar para a morte justamente para dar sentido pra vida, para entender que ela vai acabar”, completa.

Conversas sinceras sobre viver e morrer

Você já pensou em conversar com a sua família sobre a sua própria morte? Sabe se seu pai gostaria de ser cremado ou enterrado? Ou, mais ainda: já perguntou para sua mãe  de que forma ela gostaria de ser tratada caso descobrisse uma doença terminal? Isso pode parecer surreal para muita gente, desnecessário para outros e triste demais para a maioria. Para Tom, não: falar sobre a morte é necessário. “Quando você fala: ‘Tá bem. Vamos falar sobre isso’, esse medo vai aos poucos diluindo. Ao mesmo tempo, você conversa com pessoas e vai criando uma conexão, uma proximidade. Vocês vão falar sobre coisas que são importantes para cada um de vocês”. Segundo Almeida, conversar sobre essas situações não significa conversar sobre a morte, e sim o contrário. “No fim, é um convite pra vida, para decisões importantes”, afirma. 

De acordo com o idealizador do inFinito, é crucial que as pessoas falem sobre seus anseios e vontades, inclusive em situações como a proximidade da morte. Isso, segundo ele, diz respeito tanto ao paciente quanto a quem fica: “Se eu, como paciente, falar como eu quero ser cuidado, quais são as pessoas que eu quero perto de mim, o que é importante pra mim, até onde eu quero ser cuidado, as pessoas que estão cuidando de mim não precisam tomar essas essas decisões sozinhas. E elas podem falar ‘eu tô cuidando, ele me pediu isso’. Então, assim, eu tô ajudando essa pessoa a elaborar esse processo, já que daqui a pouco ela vai viver sem essa pessoa que se foi.

A dor do outro

“Ao abrir a porta do apartamento, no chão estava um buquê de flores. Aquele que o trouxera se retirara em silêncio. Não tocara a campainha. Mas deixara um bilhete onde estava escrito: ‘Não quis perturbar a sua dor’”. O trecho, do poema “Morte e Silêncio”, do poeta Ruben Alves, foi escolhido por Tom quando questionado sobre uma produção que reflete no seu jeito de lidar com as perdas. E, para além de lidar bem com o próprio luto, é imprescindível que lidemos bem com a perda das outras pessoas. “O luto processo é um natural e todo mundo vai viver, vai sofrer e chorar. Vai ser difícil, mas, aos poucos, a gente vai se reorganizando”, afirma Almeida. 

. “Sim, é um recomeço, ele tem que acontecer. Mas, ao seu tempo, sem pressa” ressalta Almeida sobre o respeito ao tempo e a dor do outro. “Como sociedade, a gente coloca uma pressão, uma urgência. Não é assim”, ressalta Almeida.  “É importante, primeiro de tudo, que as pessoas deem significado para essa perda. Que elas entendam e ritualizem, no seu próprio tempo. Para ressignificar uma coisa é preciso, primeiro, significar”, completa. 

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